Envelhecer não é simplesmente contar a soma dos anos vividos. Soprar a velinha no bolo de aniversário. Não é ter somente uma idade alta. É sobretudo, uma questão de lugar. A velhice não está solta no ar, fora da vida concreta de todos nós. Possui bairro, rua, esquina, comunidade. Mora no Parque das Águas. No São Geraldo. Na Vila Esperança. Tem CEP (Código de Endereçamento Postal) o que determina muito mais do que o local de entrega de correspondências postais. Direciona o acesso à saúde, à cultura, à segurança, à mobilidade e à dignidade.
O lugar onde a gente vive nos coloca próximos ou distantes do acesso aos bens produzidos pela cidade. Em Juiz de Fora, como em tantas cidades brasileiras, envelhecer na área central é muito diferente de envelhecer na periferia. Uma senhora que vive na Avenida Rio Branco tem acesso fácil a farmácias, transporte público, clínicas, bancos, praças e outros serviços. Já um senhor que vive nas bordas da cidade, seus direitos não chegam ou chegam muito tarde.
A geografia da velhice traz em si a geografia de um país injusto, com uma enorme desigualdade social. Portanto, posso afirmar que o acesso a direitos sociais, a espaços públicos qualificados e a serviços básicos que funcionam varia conforme o CEP do titular. Nossa cidade tem mais de 100 mil pessoas com 60 anos ou mais. Pouco se fala, ou não se fala, sobre onde e como essas pessoas idosas estão envelhecendo. Para quem a cidade é planejada? Se ela exclui quem envelhece na periferia, ela falha em sua principal missão: a de ser um espaço para todas e para todos.
A cidade envelhece, mas parece que não enxerga os seus velhos, principalmente os que não estão no “Calçadão”. Se os vê não enxerga. O Estatuto da Pessoa Idosa garante direitos, mas nas franjas urbanas ele parece letra morta . E é mesmo. Que diferença faz? É urgente que as políticas públicas cheguem onde as necessidades das pessoas são maiores. Cuidar de quem envelhece na periferia é dever do Estado, mas também é responsabilidade de todos nós. Se queremos uma cidade justa, precisamos começar pelos que mais precisam. Porque a periferia também envelhece e merece envelhecer com dignidade. Tudo é urgente!
É urgente também que essas políticas públicas levem muito em consideração o território: o lugar onde se vive determina o modo como envelhecemos. Territórios marcados pela negligência do poder público, pela violência ou pela falta de acessibilidade tendem a impor uma velhice de isolamento e vulnerabilidade. Um envelhecimento mais duro, hostil, solitário e invisível. Enquanto que em bairros com toda infraestrutura urbana assegurada favorece um envelhecimento ativo e autônomo.
A velhice não consta somente nos dados do IBGE. Vive na Dona Maria do Carlos Chagas, no seu Zé do Linhares, na Tia Lucia do Pedras Preciosas. É uma realidade humana profundamente marcada pelo lugar onde se vive. É tempo de os gestores públicos, os vereadores e vereadoras e sociedade em geral perguntarem: que cidade estamos construindo para envelhecer?
A velhice tem CEP e merece respeito onde quer que se more. O envelhecimento no lugar, ou seja, garantir a permanência das pessoas idosas em suas comunidades, com qualidade de vida – isso deve nortear as ações públicas dos planejadores da cidade. Fica evidente perceber que é preciso territorializar os cuidados com a velhice no espaço urbano. Envelhecer bem ou mal depende muito de onde a gente vive, da estrutura urbana, dos serviços públicos presentes e das condições socias do território.
Jose Anisio Pitico
Assistente social e gerontólogo. De Porciúncula (RJ) para o mundo. Gosta de ler, escrever e conversar com as pessoas. Tem no trabalho social com as pessoas idosas o seu lugar.
Fonte: https://tribunademinas.com.br/colunas/apessoaidosaeacidade/31-08-2025/a-velhice-tem-cep.html